Cinematografia Brasileira

PUBLICIDADE / NUBANK

YOUR FUTURE

Por Gabriel Bianchini

A proposta do filme “Your Future” era documental, com personagens reais. O resultado final é uma mistura grande. A ideia era ser o mais natural possível dentro das possibilidades de negociação com o cliente. No fim das contas, algumas situações são produzidas, mas todas as pessoas são verdadeiras, especiais, tratadas com carinho e respeito nos lugares onde realmente vivem e trabalham. A versão final do Nubank e a versão do diretor Fernando Nogari possuem diferenças em relação a tudo isso.

Todas as cenas foram filmadas em Salvador e nos arredores da cidade. O intuito era representar o Brasil, uma bela escolha de Nogari. O critério foi social. É um lugar mágico, onde as pessoas são especiais, mais abertas, muito legais, participativas, espontâneas, nos contam histórias e querem mostrar coisas novas. É maravilhoso fotograficamente, com prédios históricos e detalhes que lembram outras cidades.

Todas as cenas foram filmadas em Salvador e nos arredores da cidade. O intuito era representar o Brasil, uma bela escolha de Nogari. O critério foi social. É um lugar mágico, onde as pessoas são especiais, mais abertas, muito legais, participativas, espontâneas, nos contam histórias e querem mostrar coisas novas. É maravilhoso fotograficamente, com prédios históricos e detalhes que lembram outras cidades.

Carol Ozzi, diretora de arte, foi muito importante, assim como Edvaldo Raw, que é baiano e fez a direção de fotografia da segunda unidade. Durante o tech scout, conversamos bastante nas viagens de van sobre as imagens que íamos produzir. Era uma discussão muito interessante sobre o que estávamos fazendo, não só fotograficamente, mas também socialmente. Queríamos entender até que ponto conseguiríamos deixar as pessoas que estávamos filmando à vontade, assim como as pessoas que iam assistir. Consultei muitos amigos, para buscar mais embasamento. Acho que ultrapassamos o processo da fotografia como beleza e alcançamos uma fotografia social. Não sabíamos até que ponto poderíamos gerar uma discussão sem ter nosso olhar burguês ali por trás. Todo cuidado é pouco.

Propus fotografar tudo com uma lente só. Usamos uma lente de 35 milímetros em uma câmera Arri Alexa Mini LF. Quando aplicada na LF, a 35 mm vira uma 28 mm. O kit era Cannon K35. Só não usamos na cena do cavalo porque estávamos muito distantes, então precisamos trocar por uma 85 mm, mais fechada. Nas ruínas do cinema abandonado, também trocamos para mostrar melhor a dimensão do espaço.

Foram mais de 30 imagens. A linguagem adotada casou tudo isso. Quando passamos de uma cena para outra, essa identidade está ali, viva. Esse ruído está enraizado. É algo que vem do meu trabalho com fotografia analógica. A lente 35 mm é vintage e cabe em uma Large Format. Você tem ali um pouquinho de sujeira, mas ao mesmo tempo é uma imagem de alta definição.

Tomara que meus amigos consigam fazer trabalhos legais assim, com essa liberdade de criar junto com o diretor e exercer a fotografia livremente. Acho que é um ciclo que fará os clientes verem o resultado e decidirem fazer mais dessa forma. Foi muito gratificante. Espero que copiem e que façam mais dessa forma.

Estilo, escolhas e referências

Nogari me deu a liberdade total de mostrar meu próprio estilo de fotografia, que está ligado ao meu trabalho de still. Quando possível, tento apenas pegar trabalhos que não tenham muita luz artificial ou que não sejam filmados em estúdio. Prefiro luz natural, sem equipamentos pesados.

As cenas são situações que eu pessoalmente gostaria de fotografar em still. São coisas que eu fotografaria para mim, que me interessam. Algumas imagens foram feitas fora do cronograma oficial da produção, pois eu queria muito filmar por interesse pessoal. Fiz questão também de viajar antes para passar mais dias com Nogari e Carol para escolher as locações juntos. No total, me envolvi no projeto durante quase um mês, com apenas cinco dias de filmagens. Fiz questão de estar mais envolvido. É raro surgir um tipo de trabalho que permita essa preocupação fotográfica, com personagens reais.

A movimentação de câmera gera uma sensação de imersão dentro da fotografia. Os movimentos, feitos com o Freefly MoVI, proporcionam esse efeito imersivo e ao mesmo direcionam o olhar para os personagens e ações em destaque. Em algumas cenas, movemos para frente. Em outras, movemos para trás. Sempre com uma velocidade calma. Depois da preparação da composição, filmávamos rápido. Não precisava ser uma steadicam porque era tudo muito simples e frontal, sem desvios para os lados.

O preto & branco foi uma proposta do Nogari. Ele já estava com essa batalha ganha quando eu entrei no filme. Filmamos tudo em P&B e nem sequer visualizamos as imagens coloridas. Todos os tons foram definidos no Look Up Table (LUT). Depois houve um pouco de tratamento de cor e mexemos no contraste. A pós foi feita por Fernando Lui, da Marla Colour Grading.

Uma das principais referências que utilizei para o filme foi o trabalho dos fotógrafos Alex Majoli e Paolo Pellegrin. Fui inúmeras vezes à biblioteca do Instituto Moreira Salles (IMS) de São Paulo para consultar o livro “Congo”, lançado por eles em 2015, muito raro e difícil de encontrar. Quando a bibliotecária me via, já buscava para mim. Felipe Delgado era o nosso Técnico de Imagem Digital (TID). Ele deu uma olhada em algumas imagens que eu selecionei do livro e fez três LUTs que nós testamos nas cenas que filmaríamos. No fim das contas, escolhemos um deles.

Delgado estava empolgado para trabalhar com P&B. Além de fazer os LUTs, ele já dava um tapa geral no fim do dia. Já cuidava do contraste e acrescentava vinhetas onde achava legal. Já puxava um pouco das peles. Os frames já chegavam para nós com um tratamento. Ele é super rápido.

A fotógrafa Elza Lima foi minha maior influência para esse trabalho. Quando Nogari me convidou para participar, comprei o livro dela para estudar. Claudia Andujar, Luiz Braga, Miguel Rio Branco e Mário Cravo Neto são referências que também preciso sempre falar, pois são a base da fotografia brasileira.

Tentei usar pouca luz, por uma questão de dinâmica de trabalho. Eu tinha medo de assustar as pessoas que nós retratamos. Tirar a luz do sol que entrava era mais importante do que acrescentar uma luz artificial. No caminhão de bananas, por exemplo, filmado em uma zona cerealista, a luz era completamente natural.

Nesse projeto, o nascer e o pôr do sol não necessariamente são uma luz boa. Meio-dia era uma luz ótima. O contraste interessava mais. Essa possibilidade ajudou nosso cronograma nos momentos em que precisávamos das horas mágicas, já que sobrava tempo para aguardarmos até o fim de tarde e início da noite.

Para filmar ao ar livre, escolher bem os horários é essencial. É importante saber usar o Sun Seeker a nosso favor e ter um bom diálogo com a assistência de direção, com uma conversa aberta. Nessa proposta de fotografia mais contrastada, gosto de usar Butterfly para negativar um lado e deixar o outro lado mais soft com outro Butterfly. Espelho é algo difícil de manipular, mas fica magnífico quando você consegue achar o ponto e recortar a luz. Costumo testar tudo nas próprias locadoras na hora de escolher, apesar de ser um ambiente bem diferente das locações. Não consigo misturar luz natural com LED, pois acho que não combina.

Precisei criar algumas soluções com refletores porque pegamos alguns dias muito nublados. Na cena da mãe que está com as duas filhas no sofá, por exemplo, o tempo estava fechado. Para reproduzir a luz que eu vi no tech scout, usei um Fresnel de 20 mil rebatido em uma grande parede amarela. Eu sempre deixava no caminhão as Asteras, os SkyPanels e os equipamentos maiores para poder usar quando fosse preciso manter a identidade geral do filme nos dias mais chuvosos.

O treino no campo de terra

Uma das minhas cenas preferidas é o campo de terra onde um grupo de homens faz um aquecimento, como se fossem jogar futebol. Esse momento é ficcional. Eu cheguei nesse lugar alguns dias antes e filmei um ensaio com o celular, com crianças que estavam lá. Me inspirei no filme “Roma”, de Alfonso Cuarón, no momento em que personagens treinam artes marciais, em um espaço aberto, sob contraluz do sol no plano e no contraplano. Fomos lá e decidimos o melhor horário. Estava meio nublado, com chance de chover, o que poderia deixar a terra molhada. Por causa disso, levamos máquinas de fumaça e sacos de saibro, que espalhamos no chão e usamos ventiladores para simular a poeira. Posicionamos os caras e tocamos música para eles. Os personagens realmente são daquela comunidade, mas nem todos costumam jogar ali. Filmei sobre uma grua. Foi difícil organizar isso tudo, mas deu certo.

Fogo, cavalo e baleia

Foi emocionante filmar com fogo de verdade. Quem produziu as chamas foi Martão, uma lenda no cinema brasileiro para cenas de explosão. O produtor de locações encontrou um sítio onde havia uma construção abandonada, uma casa construída pela metade. Fizemos uma proposta e a proprietária permitiu o incêndio. Usamos gás com bastante controle. Para produzir fumaça, acrescentamos pedaços de madeira. A proposta, porém, era não focar na casa, mas no mutirão de pessoas que carregavam os baldes. Precisamos filmar muito rápido, com a câmera envelopada, pois estava chovendo.

Filmamos a cena do cavalo em um domingo no Centro de Salvador. O personagem foi encontrado de última hora. Não é fácil achar alguém que consiga cavalgar em pé. Todo mundo ficou nervoso. O cavalo travou e o ator também ficou muito nervoso. Conseguimos filmar de dois ângulos, em takes únicos.

Para fazer a baleia, primeiro procuramos em bancos de imagens, mas não encontramos naquele ângulo de cima, então decidimos filmar com algum objeto para animar na pós. Quase desistimos, mas a produção encontrou uma baleia de isopor que era uma alegoria de um bloco de carnaval. Ela foi colocada no mar junto com pesos para não ser levada pelas ondas, que estavam muito agitadas. A cauda foi feita em 3D na pós, assim como a textura. Usamos uma foto de referência para definir a quantidade de pessoas e a movimentação de salvamento de uma baleia nesse tipo de situação. Foi cansativo, mas funcionou e fomos beber para comemorar.

Metrô

Alugamos uma estação do metrô de Salvador com um trem parado. A plataforma era nossa. Custou dez vezes menos do que pagaríamos em São Paulo. Toda a figuração foi produzida. Embarraquei tudo, iluminei certinho do jeito que eu queria. Usei Astera com colmeia. Em cima do personagem que dorme, a potência da luz era maior. Nas outras pessoas, eram luzes mais fracas e pontuais. Negativei o vagão com um Butterfly preto por fora, fiz praticamente uma caixa. Joguei um SkyPanel bem fraquinho para desenhar os volumes da superfície metálica. Foi uma das cenas mais montadas e publicitárias.

Segunda unidade

Nas cenas da segunda unidade, Edvaldo Raw usou um LUT diferente do meu. Como ele estava com uma câmera RED Komodo 6K, o LUT dele não era tão contrastado quanto o meu, era mais soft. Ele filmou o beijo, o motociclista, os meninos sentados na pedra, a senhora com patuás, a chuva inicial e a mãe que espera o ônibus com a filha.

Terceira unidade

A campanha também envolveu retratos de Anitta feitos pelo fotógrafo britânico Platon, um cara que é conhecido por causa de fotos de pessoas famosas como Prince, Adele, Vladimir Putin, o casal Michelle Obama, Barack Obama e Mark Zuckerberg. Ele a fotografou em Miami, onde Nogari filmou a cena em que ela aparece no backstage de um show.

Formação

Minha escola é a fotografia still. Sempre fui apaixonado por fotografar nas ruas. Eu sempre carregava uma câmera, mas escolhia os momentos certos para fazer as fotos porque a revelação e a ampliação eram muito caras para mim. Como técnica para economizar, eu escrevia tudo antes, para planejar bem o que queria retratar e só clicar na hora certa. Não dava para gastar muito dinheiro.

Me mudei de Jundiaí para São Paulo aos 17 anos de idade e trabalhei durante três anos em um estúdio comercial na Bela Vista, como assistente, office boy, na limpeza e em outras funções. Tive contato com vários fotógrafos e fotógrafas que alugavam esse estúdio. Nos primeiros 10 anos na capital, atuei também como freelancer e em algumas agências. Quando entrei no curso de Publicidade na Casper Líbero, no prédio da Gazeta, passei a trabalhar no jornal estudantil Esquinas de São Paulo e tive acesso livre ao laboratório da faculdade, onde havia câmeras, filmes e materiais químicos à minha disposição. Eu tinha as chaves, era um tesão.

Aos poucos, comecei a fazer assistência em filmes publicitários, recomeçando do zero, como video assist. Fui chamado para fazer packshots em filmes publicitários e acabei conhecendo pessoas que me possibilitaram dirigr a fotografia de pequenos filmes. Percebi que filmar significava todo um novo mundo a ser explorado com lentes e mecanismos de câmera, como possibilidade de transformar o que eu fazia no still em imagens contínuas.

Sempre mantive o hábito de estudar livros de fotografia e de história da arte, por influência de um amigo, Henrique Mangeon, que conheci naquele primeiro estúdio onde trabalhei. Ele me estimulou a desenvolver um trabalho autoral paralelamente à publicidade. Essa é minha prioridade até hoje. Pago minhas contas e uso o restante do que ganho para fazer viagens e fotografar minhas coisas. Em casa, tenho meu laboratório de revelação.

Mini bio

www.gabrielbianchini.com

Gabriel Bianchini (codinome Sete Pele) acredita na fotografia como ferramenta de transformação social. Ele costuma fazer viagens pelo interior do Brasil para fotografar a riqueza sociocultural do povo em cenários de contrastes. No cinema, assinou a segunda unidade da direção de fotografia do curta-metragem “Rise Up”, do norte-americano Bryan Buckley, lançado no Festival de Tribeca em 2021. No Brasil, filmou “Cativeiro” (2020) e “Meu coração já Não Aguenta Mais” (lançado no Festival do Rio em 2021), ambos dirigidos por Fabricio Brambatti (Urso Morto). Na publicidade, fotografou comerciais de marcas como Petrobras, Scania, BMW, Spaten e Nike, além da campanha “Árvore Refugiada”, do projeto The Climate Reality, e dois videoclipes da cantora Iza. Nasceu em Jundiaí e formou-se em Publicidade na Faculdade Casper Líbero. Alguns de seus ensaios fotográficos pessoais podem ser encontrados em seu site oficial e no instagram @sete.pele.

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